PJ apreende texto de teatro

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É a apreensão mais surpreendente do ano na Europa e a mais inusitada de sempre em Portugal. A Polícia Judiciária apreendeu hoje 327 páginas do texto da peça “Fake”, a dois perigosos autores portugueses, directores de uma associação alegadamente cultural, a Formiga Atómica: Inês Barahona e Miguel Fragata.
A razão da apreensão prende-se com a descoberta de que, por detrás do aparentemente inócuo texto teatral, se encontrava uma cartilha detalhada para que mulheres em todo o mundo pudessem assassinar os seus maridos ou companheiros. Julga-se que a dupla de criadores terá ligações ao movimento #metoo, embora até ao momento não tenha sido possível confirmar. O texto – que iria ser impresso com a chancela de confiança do Teatro Nacional D. Maria II – destinava-se a vários países europeus, transportado por traficantes, designados de “programadores”, que o viriam recolher a Portugal, na estreia da peça.
Jorge Bráulio, da Direcção Geral de Investigação ao Tráfico de Receitas Criminosas, responsável pela operação “Tchekov mente”, disse ontem que o texto apreendido faz parte de um “fortíssimo conjunto de dramaturgia de incitamento ao crime, de elevada estatura internacional”. Aliás, sublinhou, a presença da Formiga Atómica no Festival d’Avignon, prestigiado certame internacional de teatro, terá sido o pontapé de saída para a actividade criminosa da associação cultural, já em conluio com “programadores”, leia-se traficantes, internacionais.
Uma peça na engrenagem
O texto terá sido apreendido nos computadores da dupla de autores, Inês Barahona e Miguel Fragata, embora a polícia se tenha deparado com o puzzle de 59 versões que os criminosos detinham nos seus dispositivos informáticos. Foram também notificados os restantes “criativos”, por suspeitas de que os mesmos possam ser portadores de cópias, passíveis de disseminação incontrolável na dark web.
Foram ainda apreendidos todos os computadores do Teatro Nacional D. Maria II, bem como o servidor, por forma a ser passado a pente fino todo o manancial de informação referente à peça “Fake”, bem como a outras peças que possam, eventualmente, fazer parte desta engrenagem criminosa de alcance global.
Em virtude destas apreensões, os ensaios da referida peça foram interrompidos, bem como toda a actividade do teatro, agora paralisado pela ausência de instrumentos de trabalho para os funcionários.
Falta de público faz de Portugal um veículo de disseminação de receitas criminosas
A ausência de visibilidade da maior parte dos textos teatrais produzidos em Portugal, expressa no reduzido número de espectadores, tem permitido aos autores enveredar pela escrita encriptada de guiões criminosos que depois circulam pela Europa, sem levantar suspeitas, segundo a polícia.
O facto de muitos espectadores acusarem os artistas de criar espectáculos arrevesados e impossíveis de compreender vem alimentar esta pista de que, muito provavelmente, estaremos perante a ponta do iceberg no que diz respeito à descoberta da verdade: a maior parte dos textos teatrais portugueses não são, afinal, o que parecem.
Atendendo à dificuldade com que vivem os artistas em Portugal, não seria difícil que fossem seduzidos por esta via de actividade, de onde poderiam colher os proventos que de outra forma lhes são vedados.
No entanto, o crescimento de público do Teatro Nacional D. Maria II parece ter finalmente permitido identificar, pela primeira vez, esta prática dissimulada dos artistas que, servindo-se da metáfora e do simbolismo teatral, estariam a desencadear fenómenos de violência e criminalidade.
Ministra rejubila
A Ministra da Cultura dirigiu-se já às instalações da PJ para felicitar os investigadores envolvidos na operação. Graça Fonseca agradeceu à Polícia o seu trabalho de separação “do trigo do joio”, que em muito facilitará no futuro a atribuição de apoio “às companhias e artistas que realmente fazem um trabalho sério”, sem recorrer “aos subterfúgios das metáforas e ao registo insidioso de subtexto” de que se servem “aqueles que se apelidam de artistas para não revelarem ser criminosos”.
Com esta operação, a PJ colocou-se “ao nível das melhores polícias europeias e numa posição de charneira em termos de cooperação internacional”, afirmou Jorge Bráulio, da Direcção Geral de Investigação ao Tráfico de Receitas Criminosas, tendo, contudo, destacado “o enorme esforço dos poucos recursos humanos da polícia”, cujos elementos foram obrigados a ler, na íntegra, “um texto teatral com mais de três centenas de páginas”.